domingo, setembro 26, 2010

Delermando e a riqueza literária de Goiás

“A Casa Cheia de Vazios” não só confirma o talento de Delermando Vieira, como também explicita uma espécie de diálogo ético, estético e etário com várias gerações de poetas

RO­NAL­DO CA­GI­A­NO - Es­pe­ci­al pa­ra o Jor­nal Op­ção

Ca­da no­vo li­vro de De­ler­man­do Vi­ei­ra vem acom­pa­nhan­do de um so­pro mís­ti­co e de um mer­gu­lho exis­ten­ci­al, ca­rac­te­rís­ti­cas pe­cu­li­a­res des­se au­tor que se di­fe­ren­cia da atu­al sa­fra de es­cri­to­res por uma dic­ção au­tên­ti­ca num mo­men­to cru­ci­al em que a li­te­ra­tu­ra bra­si­lei­ra pa­de­ce do ví­cio da ob­vi­e­da­de, con­ta­mi­na­da pe­la re­ci­cla­gem de ve­lhas ten­dên­cias.

“A Ca­sa Cheia de Va­zi­os” (Ed. UCG, Sé­rie Ver­so, 2010) pro­vo­ca no lei­tor um alen­to es­té­ti­co acom­pa­nhan­do de um es­tra­nha­men­to, que nas­ce da pro­fun­da re­la­ção do au­tor com a tran­scen­dên­cia e o oní­ri­co. Ora per­me­a­do de re­quin­tes gó­ti­cos ou bar­ro­cos, ora mer­gu­lha­do ca­ver­nas in­tan­gí­veis da al­ma — al­go que nos re­me­te so­li­dões an­ces­tra­is da pró­pria ida­de da Ter­ra — os no­vos po­e­mas de De­ler­man­do pe­ne­tram as fres­tas ín­ti­mas pa­ra uma ten­ta­ti­va de com­pre­en­são, mas tam­bém de apa­zi­gua­men­to de nos­sos em­ba­tes psi­co­ló­gi­cos e nos­sas in­qui­e­ta­ções me­ta­fí­si­cas.

A his­tó­ria de si­lên­cios e va­zi­os, que in­co­mo­da o ho­mem e é res­pon­sá­vel por er­guer-lhe abis­mos in­tran­spo­ní­veis, ins­tau­rou a an­gús­tia que tan­to o exi­la ou apar­ta, sen­ten­ci­an­do-o a vi­ver um per­ma­nen­te es­tá­gio de di­le­mas pes­so­ais, se­jam éti­cos, quan­to afe­ti­vos e fi­lo­só­fi­cos. É so­bre o des­mon­te des­se ca­os he­re­di­tá­rio e abis­sal, que vem pon­tu­an­do as re(l)ações na pós-mo­der­ni­da­de, que De­ler­man­do ten­ta exor­ci­zar. E na me­di­da em que uti­li­za a pa­la­vra co­mo ins­tru­men­to ci­rúr­gi­co, e de do­lo­ro­sa ca­tar­se, “re­gur­gi­ta sua so­li­dão” pa­ra com­pre­en­der as som­bras e sus­tos da tra­je­tó­ria pes­so­al e co­le­ti­va.

Es­se tra­ba­lho ra­ti­fi­ca que “o si­lên­cio ain­da é a mais vas­ta fa­la”, por­que no con­cen­tra­do va­zio das pa­la­vras es­tá to­da a po­tên­cia sen­so­rial do ar­tis­ta. É no vá­cuo do que não foi di­to, que há ver­da­dei­ra­men­te a car­ga de pos­si­bi­li­da­des pa­ra in­ter­di­ção da me­lan­co­lia, co­mo se nu­ma se­quên­cia de pa­limp­ses­tos, o po­e­ta fos­se ex­plo­ran­do e des­ca­man­do os im­bró­gli­os in­te­rio­res e des­ve­lan­do a fa­ce ocul­ta dos mis­té­ri­os e se­gre­dos hu­ma­nos, es­miu­çan­do o in­con­sci­en­te co­le­ti­vo. Uma po­e­sia apri­o­ris­ti­ca­men­te vis­ce­ral, es­fin­ge a de­sa­fi­ar o lei­tor pa­ra o (re)co­nhe­ci­men­to da­qui­lo que é es­sen­cial e hu­ma­no.

A ma­té­ria-pri­ma da es­cri­tu­ra de­ler­man­di­a­na é sua pre­o­cu­pa­ção com o des­ti­no do ho­mem nes­se mun­do de su­per­fi­ci­a­li­da­de e ro­tu­la­ções e com o lu­gar da ar­te, prin­ci­pal­men­te da li­te­ra­tu­ra, quan­do a glo­ba­li­za­ção e os fe­ti­ches do deus mer­ca­do são an­tí­po­das do pen­sa­men­to e da emo­ção. E nes­se trân­si­to, per­ce­be-se um (in)ten­so di­á­lo­go não só com a re­a­li­da­de ex­te­ri­or (so­ci­al, ge­o­grá­fi­ca, po­lí­ti­ca e mo­ral) co­mo tam­bém uma in­ves­ti­ga­ção do su­prarre­al, do in­vi­sí­vel, do que es­tá en­co­ber­to ou sub­ja­cen­te em nos­sas fan­ta­si­as, do que emer­ge das ver­ti­gens pes­so­ais, do que so­bre­vi­ve de nos­sa mar­gi­na­li­da­de psí­qui­ca, num ver­ti­gi­no­so in­ven­tá­rio da­que­les ter­ri­tó­rios es­cu­ros dos con­fli­tos e de­sen­con­tros/de­sen­can­tos que tan­to nos ator­men­tam. De­ler­man­do não dou­ra a pí­lu­la: vai fun­do, faz uma pon­te di­a­lé­ti­ca en­tre Eros e Tha­na­tos, atra­ves­sa o Le­tes, bus­ca al­can­çar a ter­cei­ra mar­gem do rio-exis­tên­cia, vai além do Bo­ja­dor, tran­spõe o Ru­bi­cão, ain­da que no per­cur­so de su­as idei­as, an­de nu­ma afi­a­da lâ­mi­na que nos dis­se­ca e de­sa­fia.

“A Ca­sa Cheia de Va­zi­os” não só con­fir­ma o ta­len­to de De­ler­man­do Vi­ei­ra, co­mo tam­bém ex­pli­ci­ta uma es­pé­cie de di­á­lo­go éti­co, es­té­ti­co e etá­rio com vá­ri­as ge­ra­ções de po­e­tas, além de uma ní­ti­da apre­en­são do uni­ver­so cri­a­ti­vo de gran­des mes­tres. De­ler­man­do be­beu nas gran­des fon­tes po­é­ti­cas e fic­cio­nais, por is­so é re­cor­ren­te na sua obra uma for­te ex­pres­são do in­son­dá­vel, na li­nha do já es­cre­ve­ram um Ro­ald Dahl, um San Ju­an de La Cruz, um Rim­baud ou um Ho­ra­cio Qui­ro­ga. A es­cri­tu­ra de­ler­man­di­a­na con­so­li­da uma pro­pos­ta li­te­rá­ria que ca­mi­nha sem­pre em bus­ca de uma ver­da­de in­te­ri­or, mui­tas ve­zes re­tar­da­da pe­la ce­guei­ra des­sa épo­ca uti­li­ta­ris­ta, que va­ci­la en­tre a emer­gên­cia do “ter” e a ne­ces­si­da­de do “ser”. Mais que is­so, es­se li­vro re­ve­la a au­to­no­mia e a pu­jan­ça da pro­du­ção li­te­rá­ria de Go­i­ás, um es­ta­do que tem pre­mi­a­do o lei­tor com au­to­res e obras de ele­va­do qui­la­te, na­da de­ven­do ao ei­xo he­ge­mô­ni­co e mo­no­po­lis­ta do Rio-São Pau­lo. De Hu­go de Car­va­lho Ra­mos a Ber­nar­do Elis; de Jo­sé J. Vei­ga a Ala­or Bar­bo­sa; de Co­ra Co­ra­li­na a Gil­ber­to Men­don­ça Tel­les; de Ur­su­li­no Le­ão a Jo­sé Go­doy Gar­cia; de Mi­guel Jor­ge a Sa­lo­mão Sou­sa; de Afon­so Fé­lix de Sou­sa a Edi­val Lou­ren­ço; a li­te­ra­tu­ra go­i­a­na se uni­ver­sa­li­za na obra de di­ver­sas ge­ra­ções que pon­ti­fi­cam no es­ta­do de fo­ra de­le, co­mo Ga­bri­el Nas­cen­te, Bra­si­gó­is Fe­lí­cio, He­le­no Go­doy, Val­di­vi­no Braz, An­to­nio Jo­sé de Mou­ra, Ma­ria Jo­sé Sil­vei­ra, Au­gus­ta Fa­ro, Gui­do He­le­no, Ubi­ra­ja­ra Gal­li, Wil­li­am Agel de Mel­lo, Flá­vio Car­nei­ro, Gil Pe­ri­ni, Flá­vio Pa­ra­nhos e tan­tos ou­tros.

RO­NAL­DO CA­GI­A­NO é es­cri­tor e crí­ti­co li­te­rá­rio.

sexta-feira, setembro 10, 2010

Discurso de Danilo Gomes sobre Alaor Barbosa

DISCURSO DE DANILO GOMES, RECEBENDO ALAOR BARBOSA NA ACADEMIA DE LETRAS DO BRASIL, EM BRASÍLIA, EM 9-9-2010.


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Incumbiu-me o Sr. Presidente desta Academia, Ministro Fontes de Alencar, de saudar o novo confrade, que ora recebemos com fraternal abraço e intenso júbilo. Honrosa missão para este modesto cronista mineiro, em Brasília há 35 anos. A delegação, que recebi de S. Exa., me enche o coração de alegria e o espírito de uma transcendental comunhão. Porque Alaor Barbosa é um velho e querido amigo e companheiro. E porque Alaor Barbosa é um grande escritor brasileiro, goiano de Morrinhos e agora,desde há poucos dias, Cidadão Honorário de Goiânia – justo galardão!

Grande escritor goiano, que transcendeu os limites de seu Estado natal, não só pelas altas qualidades estilísticas de suas obras, como por abordar temas de envergadura nacional,de Monteiro Lobato e seus amigos de cenáculo na Paulicéia,a Guimarães Rosa, de quem foi amigo e de cuja vida e criação literária nos tem dado uma pinacular, majestosa obra,em dois tomos: “Sinfonia Minas Gerais: a vida e a literatura de João Guimarães Rosa”, o primeiro tomo já publicado.

Nascido há 70 anos em Morrinhos, Alaor Barbosa dos Santos morou também – e ainda tem lá residência- em Goiânia; morou ainda no Rio de Janeiro, em Petrópolis e Brasília,onde mantém residência até hoje. Veio para cá a serviço, por concurso, do Senado Federal.

Escritor por vocação, por gosto, o novo acadêmico tem percorrido os territórios do romance e do conto, da biografia, da ensaística, da pesquisa literária e historiográfica. Não para de trabalhar, de produzir, de tal forma a podermos assegurar que ele se dedica à literatura e à História como um missionário incansável e com o ardor de um legionário, um escoteiro, um militante.

A simples menção do elenco de suas obras revela o quanto ele tem produzido, sempre se superando em qualidades estilísticas, em lavor estético, em informações precisas e detalhadas, checadas. Não me refiro apenas ao escritor primoroso, ao ficcionista de prol e de proa; destaco também o jornalista, desde o Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Tribuna da Imprensa, do Rio, até o Diário da Manhã, de Goiânia, onde não perco seus artigos e matérias de teor literário, jurídico, histórico e político, permeados de memorialismo. No Diário da Manhã também não perco os artigos e crônicas de nossa colega, a poeta Sônia Ferreira. Aliás, leio também “O Popular”, de Goiânia, onde colaboram notáveis cronistas. E mais: todos nós, que moramos aqui, moramos no generoso solo de Goiás, que elegeu senador o grande Juscelino Kubitschek,criador de Brasília e imortal ídolo nacional.

Bacharel em Direito, pela Universidade Católica de Goiás, Alaor Barbosa é também mestre em Literatura pela Universidade de Brasília-UnB. De sua vasta obra publicada, cumpre destacar alguns títulos. Ficaríamos aqui por horas, cavaqueando e discorrendo sobre o autor, sua obra e sua rica fortuna crítica, já que elogios vieram, em vibrantes palavras, de críticos literários, entre outros, do jaez de José Edson Gomes, Wilson Martins, José Leão Filho, Fernando Py, Gabriel Nascente, José Mendonça Telles, Gilberto Mendonça Telles,Assis Brasil, Manoel Hygino dos Santos, Modesto Gomes, Hélio Pólvora,Antônio Olinto, João Carlos Taveira, Bariani Ortêncio, Carmo Bernardes, Ronaldo Cagiano, Emanuel Medeiros Vieira e Anderson Braga Horta. Releva acentuar que, no dia 1º deste mês de setembro de 2010, o grande poeta,ensaísta e crítico literário Anderson Braga Horta recebeu Alaor Barbosa no Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, em noite mememóral, em sessão solene presidida por Jarbas Marques, na ausência do Cel. Affonso Heliodoro, em viagem a Belo Horizonte, por questões de saúde.

Da bibliografia de Alaor Barbosa, destaquemos “Caminhos de Rafael” (contos, ficções, narrativas); “Um Cenáculo na Paulicéia” (um estudo sobre Monteiro Lobato, Godofredo Rangel e outros “irmãos de opa” [no caso, confrades de letras]; “Contos e Novelas Reunidos” (uma bela edição de capa dura,com 985 páginas); “Sinfonia Minas Gerais” (que já mencionei); “Eu, Peter Porfírio, o maioral” (romance, um dos finalistas do Prêmio Leya, com o selo Dom Quixote [Portugal, 2009].

Destaco, também, “Um Lenda”, obra magnífica, de viés joyceano –a história se passa em dois dias-, em cujo personagem central, o menino interiorano Rafael Noronha, eu me revi na minha natal cidade de Mariana, Minas Gerais, na mesma época. Quando terminei de ler as 262 páginas dessa obra genial, veio-me à memória uma instigante frase de Fernando de Castro: “Mas esse é o problema dos bons livros: quando menos se espera eles acabam.” Observação que se aplica, sem dúvida alguma, aos demais livros do novo membro desta Casa, à qual o saudoso poeta e ensaísta José Geraldo Pires de Melo consagrou tantos anos de sua vida e que encontrou no atual Presidente, escritor Fontes de Alencar, um notável líder e um indormido administrador.

Outras obras do nosso novo acadêmico: “A morte de Cornélio Tabajara”, “Meu Diário da Constituinte”, “Memórias do nego-dado Bertolino d’ Abadia”, “O exílio e a glória”, “Monteiro Lobato das crianças”, “Campo e noite”, “O romance regionalista brasileiro” e outras mais, algumas dedicadas ao público infantil, como “Saci e Romãozinho”.

Além de biógrafo, também ensaísta, em “Confissões de Goiás” e “Rui Barbosa: pensamento em ação”, Alaor Barbosa já recebeu vários prêmios, consta de várias antologias, é membro da Academia Goiana de Letras e consta,como bem lembrou Anderson Braga Horta, dos dicionários de Bariani Ortêncio, Luiz Carlos Guimarães da Costa, Raimundo de Menezes, Napoleão Valadares e,ainda, da enciclopédia da Oficina Literária Afrânio Coutinho.

Um dos mais importantes livros de Alaor Barbosa é esse “Sinfonia Minas Gerais”, da Editora LGE, de Brasília, livro todo centrado na vida e na obra de João Guimarães Rosa, de quem o autor goiano, jovem jornalista no Rio de Janeiro, se tornara amigo de muita estima recíproca. O livro (refiro-me ao 1º volume, pois o 2º ainda não saiu) é uma verdadeira ode em prosa ao grande escritor e diplomata, nascido em Cordisburgo, em l908. Coloca-o o autor nas alturas, no merecido Olimpo. Ora, não é que a obra é contestada, judicialmente, pelas duas filhas de Guimarães Rosa? Espantoso, inacreditável! Um absurdo, puro capricho, um despautério! A vida e a obra de Guimarães Rosa não pertencem apenas à sua família, pois se tornaram um patrimônio do Brasil e da literatura universal.As traduções de seus livros correm o mundo.

A Associação Nacional de Escritores (então presidida pelo saudoso poeta Joanyr de Oliveira),pelo seu jornal mensal, editado pelo mestre Afonso Ligório Pires de Carvalho, saiu em defesa de Alaor Barbosa, naquele começo de 2008. Ouçamos este trecho: “Confiscar obras literárias e punir escritores são ações que, pela intolerância e pelo anacronismo que as apequenam, configuram verdadeiros autos-de-fé medievais, inconcebíveis para mentes ciosas da liberdade, da justiça e da cidadania, a duras penas conquistadas.”

Na maré montante de indignação que tomou de assalto os intelectuais cultores do Estado de Direito, o Presidente da Academia Mineira de Letras, escritor, ex-Senador e ex- Ministro Murilo Badaró (falecido há dois meses), convidou o nosso autor para proferir palestra sobre o criador de “Grande Sertão:Veredas”, na sede da agremiação, no Auditório Vivaldi Moreira. Foi uma noite histórica. Tive o prazer e o privilégio de lá estar. Alaor Barbosa, ao final de sua conferência em torno do Mago de Cordisburgo, foi aplaudido de pé por um auditório cheio à cunha – bem se lembra a esposa do conferencista, Sra. Maria Gonçalves Ribeiro, lá presente. Era Minas, pela sua Academia hoje centenária, agradecendo a Alaor Barbosa por aquela sua magnífica “Sinfonia Minas Gerais”. Aliás, Alaor Barbosa tem sangue mineiro, pela vertente paterna, e paulista, pela vertente materna.

Vou concluir, meus caros amigos.

E quero concluir declarando que Alaor Barbosa, pelo seu trabalho, seu talento extraordinário, próprio dos gênios, seu engenho e arte, alçou-se à condição de um dos maiores escritores brasileiros contemporâneos. Pertence à sua bucólica Morrinhos, pertence a Goiânia, a Goiás, a Brasília,mas transcendeu até se firmar como grande escritor nacional.

Sua obra, de excepcionais qualidades de estilo e invenção, de criatividade, de tocante lirismo e forte dramaticidade, de pesquisa, de metalinguagem, sua obra –repito- engrandece uma nação.

É, pois, com grande alegria e sinceramente honrado, escritor Alaor Barbosa, que os veteranos confrades desta Academia de Letras do Brasil o recebemos nesta noite e nos sentimos altamente honrados, com sua presença entre nós, na cadeira nº XXX, tendo como Patrono Érico Veríssimo, glória de Cruz Alta, do Rio Grande do Sul e do Brasil.

Escreveu o inimitável Eça de Queiroz que “um bom livro regozija o espírito”. Frase singela e verdadeira. Eu direi agora, perante esta ilustre assembléia de cultores da literatura e admiradores do novo acadêmico, nesta tertúlia que ficará nos anais da Casa: a obra já publicada de Alaor Barbosa realmente regozija o espírito e nos transporta a mundos vários e encantados, desde a aurora de sua vida, na sua já mítica Morrinhos, onde nasceu e morou o menino Rafael Noronha, de “Uma Lenda”...
Seja muito bem-vindo, grande escritor brasileiro Alaor Barbosa!

Laus Deo!
Danilo Gomes
Brasília, 9/ 9/ 2010.

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Posse de Alaor Barbosa no IHGDF

DISCURSO DE POSSE DE ALAOR BARBOSA COMO MEMBRO EFETIVO (CADEIRA 68) DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO DISTRITO FEDERAL, PROFERIDO NA NOITE DE QUARTA-FEIRA, 1º (PRIMEIRO) DE SETEMBRO DE 2010.



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Ao atravessar os umbrais desta casa histórica para me incorporar ao valoroso número dos homens e mulheres que a integram, sinto muita emoção, muita alegria, muita satisfação íntima, muito entusiasmo e muita gratidão. Desde logo, manifesto minha gratidão àqueles que, elegendo o meu nome, me trouxeram ao seu honroso, instrutivo e educativo convívio. Dentre eles, saliento a pessoa de José Luiz de Moura Pereira, esse dedicado trabalhador do Espírito: heraldista competente e produtivo – autor, dentre outras, das bandeiras do Estado do Tocantins e da Associação Nacional de Escritores, jornalista emérito, condição em que escreveu e há catorze anos publicou a importante obra Hipólito da Costa – o Patriarca da Imprensa Brasileira , professor de Desenho, ocupante, neste sodalício, da cadeira que tem como patrono a riquíssima personalidade emblemática de Irineu Evangelista de Souza, Barão de Mauá. Foi José Luiz de Moura Pereira, novo amigo antigo que me orgulho de ter granjeado nesta cidade tão dadivosa, quem indicou meu nome para ser convocado a entrar nela e sentar-me em uma das suas cativas e cativadoras cadeiras. Devo mencionar também a figura deste operoso e valente jornalista goiano nascido em Minas Gerais, Jarbas Marques, com quem tenho algumas ligações histórico-biográficas advindas principalmente de amizades comuns, formadas na generosa terra goiana. Neste capítulo de agradecimentos necessários, mas feitos com imensa satisfação íntima, certamente não posso esquecer a forte personalidade do patrono perpétuo e há muito tempo vigoroso sustentáculo deste Instituto, o nunca assaz celebrado militar, historiador e memorialista Affonso Heliodoro dos Santos. Ele é um patrimônio moral desta Cidade, da sua terra, Minas Gerais, e da Nação brasileira.

Assinalo e registro que minha emoção de passar a habitar esta Casa na condição de seu legítimo morador é, e não pode deixar de sê-lo, fortemente aumentada pelo fato de ter ela por Patrono – histórico, moral, cultural e político – a personalidade tão digna e ilustre quanto se possa ser de Juscelino Kubitschek de Oliveira. Juscelino – o mais criativo, o mais dedicado, o mais dinâmico, o dotado de mais lúcida visão geral e de futuro deste País, o melhor Presidente da República que temos tido, o corajoso autor do segundo começo – segunda fundação – da nacionalidade brasileira.

Ao me pôr a pensar no que dizer neste meu discurso de posse na Cadeira 68 deste glorioso Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, concluí muito rapidamente que eu teria de fazê-lo bastante sintético. Não havia nem há como fugir a esse critério e método, por ser muito vasto, numeroso e abrangente o material que me pede, nesta ocasião privilegiada e feliz, focalização e tratamento. Material suficiente, penso eu, para me conduzir a resvalar para um ensaio longo, com inevitável extensão de livro volumoso. Pois como deixar de falar, em ocasião assim tão adequada e imperiosa, em primeiro lugar da múltipla e profunda significação desta cidade de Brasília para o Brasil e o mundo, da sua história, da epopéia da sua construção, dos efeitos benéficos que tem produzido para a Nação e o País? Considero Brasília o marco inicial do encontro do Brasil consigo mesmo: a cidade deflagradora, a cidade criadora, a cidade mãe e síntese da definitiva e verdadeira nacionalidade brasileira. Brasília, diferente das demais cidades, não é filha casual dos interesses do comércio ou da indústria, mas do sonho e da poesia. Por esse aspecto, tão importante, faço minhas as verdades expressas em uma frase e em três versos do poeta Anderson Braga Horta, esse extraordinário poeta que, mercê de ter nascido e vivido em Minas, em Goiás e no Rio de Janeiro e finalmente no Planalto Central, alcançou o privilégio de poder compreender bem o significado essencial desta luminosa cidade de Brasília. A frase: “Em verdade, se poesia é criação – e, creio poder estendê-lo, autodescobrimento, comunicação entre os homens –, Brasília nasceu sob o signo da poesia” Os versos: “No altiplano de nossas esperanças,/ Rosa-dos-homens / Construímos-te futura”. Inevitável falar daqueles que a tornaram realidade, especialmente do fundador e construtor, Juscelino Kubitschek de Oliveira, e dos seus colaboradores diretos na obra portentosa que realizou como Presidente, dos quais um se fez enérgico, rigoroso, persistente e fiel sustentáculo deste Instituto, o seu presidente perpétuo Affonso Heliodoro dos Santos. Quanto a este grêmio, imperioso falar do seu forte significado para esta cidade, e desde logo assinalar que ele não congrega apenas estudiosos de História e Geografia, mas homens que têm feito, eles mesmos, a história de Brasília: além de testemunhas, protagonistas. Nesta categoria, a dos atores da História, é preciso mencionar o patrono da minha Cadeira, de número 68, o valoroso político e intelectual do meu Estado, Domingos Velasco. Um dos pioneiros do movimento socialista no Brasil. Por esse aspecto, um lutador solitário em Goiás e saliente entre poucos no plano federal. Nascido na Cidade de Goiás, Capital do Estado, em 8 de outubro de 1889, e falecido no Rio de Janeiro em 1973. Jornalista e político, foi senador e deputado e candidato, em 1935, em eleição indireta (pela Assembléia Constituinte) a governador de Goiás. Nos últimos anos de vida, foi magistrado, tendo ocupado o cargo de juiz (ministro) do Tribunal Superior do Trabalho. Escritor, produziu alguns livros sobre temas que dominava; em um desses livros, prestou valioso depoimento sobre a China Continental, que visitou na década de 1950, poucos anos depois da Revolução de 1949, conduzida por Mao Tse Tung. Sua fecunda carreira política ele a transferiu, nos últimos anos de vida, para o Estado do Rio de Janeiro, onde foi eleito deputado federal pelo Partido Socialista. Não obstou essa mudança a que ele adquirisse também uma pequena propriedade rural aqui no novo Distrito Federal. Uma descrição da trajetória vital do meu antecessor, Joanyr de Oliveira, com uma análise, ainda que breve, da sua obra de poeta e de escritor, não poderia ser feita, se analítica, de modo exíguo ou sucinto: o material a ser exposto e analisado é por demais abundante e valioso. Inevitável também uma referência à significação intelectual e à obra literária do poeta incumbido de me receber, Anderson Braga Horta: para falar dele é preciso tempo e um condigno número de palavras. Trata-se, sem dúvida, de um dos mais representativos criadores de poesia do nosso país.

Feita esta advertência sobre a necessidade imperativa de ser antes sintético do que analítico ou descritivo, falo, em primeiro lugar, de Brasília. Muito já se falou, mas nunca se terá falado bastante de Brasília. Duas das antologias poéticas feitas pelo meu antecessor nesta cadeira, o poeta Joanyr de Oliveira, intituladas Brasília na poesia brasileira e Poemas para Brasília, revelam que Brasília é provavelmente, dentre todas as cidades do Brasil, a mais presente e cantada na poesia brasileira.

Quanto a mim, particularmente, é profunda e forte a emoção de falar de Brasília, pois profunda e complexa e rica é minha relação histórica e vivencial com ela. Posso sinteticamente expressá-la declarando que poucos prazeres desfruto na vida tão intensos quanto o de ver, contemplar e sentir Brasília andando através dessas criações geniais de Lúcio Costa que são as suas bucólicas superquadras residenciais ou percorrendo os seus retilíneos eixos e praças dotados de indescritível beleza plástica, que faz bem aos olhos e à alma. Brasília é um alumbramento e um deslumbre quotidianos, que se renovam e se repetem, para mim, a cada nova manhã, debaixo da abóbada do amplíssimo céu quase sempre desdobrado em límpido azul. Aqui o fugitivo horizonte é longe e perto e belíssimo, principalmente na hora do amanhecer e na hora em que o Sol descamba tantas vezes aumentado em vermelhíssima formosura. Para dizer muito, senão tudo, digo que Brasília é, de todas as cidades onde já morei, aquela onde jamais senti solidão. Ela me revolve sentimentos muito profundos, alojados nos longes das minhas origens e nos recônditos da minha evolução e desenvolvimento. Sou goiano. Dizer isto já é dizer muito, embora não, com certeza, dizer tudo a respeito da sensibilidade com que me relaciono com esta cidade, vá lá um adjetivo que, por banalizado, não me apraz muito empregar, mas que é forte e significativo: com esta cidade mágica.

Um pouco da minha relação histórica com Brasília eu preciso contar. Vou ser breve. Quando eu tinha oito anos de idade, estudando no Grupo Escolar Coronel Pedro Nunes, em minha cidade natal, Morrinhos, na região Sul de Goiás, todos os dias de manhã, na sala de aula, eu via um mapa do Estado de Goiás afixado à parede, ao lado do quadro-negro. Frequentemente eu me postava diante do mapa, e lia nele. Desde a primeira vez eu notei um pequeno retângulo demarcado um pouco acima do nome Goiânia escrito assim: FUTURO DISTRITO FEDERAL. Não sei quem me explicou que aquilo significava a mudança da Capital Federal para Goiás – mudança ideada e programada para acontecer um dia. Eu me perguntava intimamente, com alguma ansiedade, quando seria que isso ia acontecer: a vinda da Capital Federal para Goiás. Mais do que aspiração, essa idéia virou um sonho, lá uma vez ou outra lembrado.

Mais tarde, me habituei a ler, mais ou menos dos nove anos em diante, jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo, que chegavam com abundância e regularidade, embora com atraso de quase uma semana, na venda do meu pai. Dado que constituíam material de embrulho, os mais volumosos, mormente aos domingos, eram os mais valorizados: o Correio da Manhã e O Estado de São Paulo. O Correio da Manhã editava um caderno especial – uma revista – com o nome Ingra. Nela colaborava uma jornalista goiana, Daisy Porto, natural de Goiás Velha, moradora no Rio havia muito tempo (anos mais tarde, tendo ido para o Rio, me tornei amigo dela). Daisy Porto mantinha nessa revista Ingra uma página de propaganda da idéia da mudança da Capital para Goiás. Um dia, acho que no ano de 1952, apareceu na Ingra uma reportagem sobre como seria o traçado da futura Capital Federal, se não me engano já batizada, nessa reportagem, de Brasília. A figura reproduzida lembrava bem, com a superposição de vias em um viaduto, a real Brasília surgida e construída anos depois. Fiquei alvoroçado ao ver aquilo. Então já se previa como viria a ser a nova Capital do Brasil? Não sei explicar o mistério dessa antecipação do projeto – do Plano Piloto – de Brasília quatro anos antes do concurso vencido por Lúcio Costa.

Fui estudar em Goiânia aos 14 anos de idade: em fevereiro de 1955. Logo me relacionei com uma rádio muito possante e popular em Goiânia – a Rádio Brasil Central, cujo lema era: FUNDAÇÃO COIMBRA BUENO PELA NOVA CAPITAL DO BRASIL. Conheci então que havia um movimento, uma luta permanente em Goiânia em favor da idéia de se trazer para Goiás a Capital do Brasil. Por causa desse movimento e luta, que envolvia numerosas parcelas do povo goiano, pode-se dizer, e isso eu compreendi depressa, que o povo goiano tinha uma causa comum pela qual lutava. Essa causa – esse ideal coletivo – o singularizava no concerto dos vários povos, chamemos assim os estados, brasileiros.

Em maio daquele ano, estava eu, de tardezinha, na Avenida Goiás, perto da Praça do Bandeirante, bem no centro daquela pequena capital de sessenta mil habitantes que exercia em mim um fascínio semelhante ao que hoje exerce Brasília, quando alguém me disse: “Vamos lá no Palácio, que o Juca Ludovico vai assinar um decreto desapropriando as terras onde vai ser construída a nova Capital”. Fui. E assisti, então, a este fato histórico: o Marechal José Pessoa, presidente da Comissão de Localização e Demarcação da Nova Capital Federal, pediu ao Governador de Goiás que desapropriasse as terras para a construção da nova Capital; o Governador assentiu imediatamente e assinou, naquele mesmo momento, não me lembro se a mensagem à Assembléia Legislativa de Goiás com o pedido de declaração da utilidade pública do quadrilátero de terras destinado à nova Capital para o efeito de ulterior desapropriação ou já o decreto de desapropriação autorizado previamente pela Assembléia Legislativa, consultada, nesta hipótese, horas antes.

No fim do ano, trabalhei, juntamente com meu irmão Eurico, na Rádio Brasil Central como redator do programa de notícias “O mundo em sua casa”, sustentado, na maior parte, por um jornalista carioca residente em Goiânia, Hely Mesquita, homem da confiança do Senador (e ex-governador do Estado de Goiás) Coimbra Bueno, proprietário e mantenedor da rádio. Essa emissora foi, sete anos depois, adquirida pelo governo estadual, na gestão de Mauro Borges Teixeira.

Um ano e meio depois, em outubro de 1956, já no Rio de Janeiro, saí eu um dia, de manhã, do apartamento em que morava, no bairro do Flamengo, na Rua Corrêa Dutra. Ao chegar diante da banca de jornais e revistas da esquina da Rua do Catete, percebi esta manchete do jornal Última Hora: JUSCELINO VAI MUDAR A CAPITAL. Alvoroçado e entusiasmado, comprei o jornal e li a notícia. Juscelino mandara ao Congresso Nacional a mensagem que propunha a criação da Companhia Urbanizadora da Nova Capital, assinada na cidade goiana de Anápolis, onde o avião de Juscelino fizera um pouso alternativo, por impossibilidade de aterrissar em Goiânia. Vislumbrei e entrevi, imediatamente, tudo o que passara a estar para acontecer. E escrevi uma crônica sobre as transformações a que estava agora condenado o sertão de Goiás. Mandei a crônica ao meu irmão Eurico, que era jornalista em Goiânia. Eu não soube senão muitos anos depois que a crônica foi publicada no Jornal de Notícias, do deputado Alfredo Nasser, em que o Eurico colaborava com bastante freqüência. Infelizmente ainda não consegui o exemplar do jornal que publicou esse meu texto. Nele havia um trecho mais ou menos nestes termos: “Agora, teremos em Goiás não mais porteiras e mata-burros, mas estradas asfaltadas e muita vida circulante...” Fazendo um repetido contraste entre não mais isso e aquilo e sim isto e aquiloutro, se desdobrava minha crônica comovida e entusiástica.

A construção de Brasília eu a acompanhei do Rio, posso dizer que passo a passo. O primeiro número da Revista Goiana, que editamos, João Carneiro de Castro Vaz e eu, em 1958 na Associação Goiana (cuja sede era na Rua Evaristo da Veiga n. 16), da qual fui secretário, estampou na capa uma fotografia do Palácio da Alvorada – imagem que se firmava, rapidamente, como símbolo da nova Capital em acelerado processo de construção. Uma reportagem mostrava os avanços desse processo.

Infelizmente, durante a construção, cometi o erro de não vir a Brasília ver as coisas. Me deixei prender no Rio pelas mil solicitações da vida de estudante e, em seguida, de jornalista profissional Mas logo no início da minha carreira na imprensa fiz uma séria tentativa de vir morar em Brasília. Foi em janeiro ou fevereiro de 1960, perto, pois, da inauguração da nova Capital. Sucedeu que a direção do Jornal do Brasil, querendo prover de profissionais a sucursal que estava instalando na Nova Capital, solicitou aos seus repórteres que quisessem vir para cá manifestassem o seu propósito. Fui um dos primeiros e poucos que se candidataram. Mas não fui incluído entre os quatro escolhidos, que foram os repórteres André Marques, um ótimo repórter e perfeito caráter, natural de Santos, em São Paulo, e Edísio Gomes de Matos, generoso e solidário cearense que mais tarde faria da advocacia sua atividade principal, embora tenha continuado jornalista competentíssimo, ambos os dois meus bons amigos; o talentoso reescrevedor Raimundo de Brito, que era funcionário da Câmara dos Deputados; e um quarto, de cujo nome não me recordo. Assim somente vim a conhecer esta cidade em setembro de 1961, logo após a crise da renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República. Eu viera do Rio a fim de passar merecidas férias em minha cidade natal, Morrinhos, extenuado que estava por causa das trabalheiras suportadas durante aquela terrível e perigosíssima crise política que quase atirou o Brasil na tragédia de uma guerra civil, e passei por Brasília, vindo na estrada Rio-Belo Horizonte-Brasília. Fui hóspede, na Superquadra 208 Sul, do meu grande e já antigo amigo e ex-colega de quarto e apartamento no Rio, José Leão de Souza Filho, um dos mais talentosos jornalistas que temos tido no Brasil, goiano natural de Mineiros, no Sudoeste goiano. Aqui passei uma semana memorável. Meu fascínio por Brasília aumentou então muito.

Em 1964, tendo de sair do Rio por causa dos mortais perigos criados pelo Golpe Político-Militar do mês de abril, estive na iminência de morar em Brasília. Meu amigo José Leão, solidário e generoso, conseguira um emprego para mim na Agência Meridional, dos “Diários Associados”. Zé Leão era redator na sucursal brasiliense d’ O Jornal, o “órgão líder” dos Diários Associados. Mas Então, me deixei prender no Rio pelas mil solicitações da vida de jornalista profissional. meu irmão Eurico obtivera para mim o emprego de redator político da Folha de Goiaz, de Goiânia, também dos “Diários Associados” – o mais antigo jornal diário de Goiânia. Preferi Goiânia, por numerosas razões ponderosas.

Somente vim a me transferir para Brasília em 1984, no mês de agosto: precisamente no dia 22 de agosto: há vinte e seis anos e dez dias. Mas isso em virtude de concurso público de provas, que me proporcionou o cargo de Procurador Autárquico Federal. Mais ou menos sete meses depois, tornei-me, também em conseqüência de concurso público, de provas e títulos, Consultor Legislativo do Senado Federal, onde me aposentei em 1993. Devo assinalar que ao me animar a fazer esses dois concursos públicos já se sentia no Brasil o bafejo saudável da aceleração do processo de retomada do processo democrático. No Senado, tive o privilégio de colaborar, intensivamente, na elaboração da nova (e atual) Constituição Federal.

Agora, duas palavras sobre meu antecessor. Se existia alguém no mundo sobre quem eu não queria falar na circunstância em que o faço hoje e agora, esse alguém se chamava Joanyr de Oliveira. Foi uma surpresa para mim verificar que era Joanyr de Oliveira o ocupante da cadeira que me tocou a mim neste Instituto. É comovido e com muito pesar e tristeza que vou falar sobre ele. Senti profundamente sua morte, ocorrida há pouco tempo – em dezembro do ano passado. Na véspera de completar 76 anos de idade: nascido no dia 6 de dezembro, deixou-nos no dia 5 desse mês do ano passado, 2009. Minha amizade crescera muito nos anos subseqüentes à volta dele dos Estados Unidos, onde passara uma longa temporada na cidade de Boston. Integrei com ele a diretoria da Associação Nacional de Escritores. Pude conhecê-lo mais de perto e com mais freqüência. Nossa amizade, nascida em 1970 em Goiânia, se robusteceu na inalterável linha da lealdade mútua, do respeito recíproco, da admiração sincera. Conheci em Joanyr de Oliveira um homem de quem se podia e devia dizer que era um homem integralmente bom.

O seu talento de poeta e contista, principalmente de poeta, tem sido proclamado com abundância de depoimentos, análises e exegeses críticas. Joanyr começou a publicar livros em 1957, ainda, no Rio de Janeiro. Sua estréia foi o livro Minha lira. O último, Raízes do ser (Poemas para Aimorés), saiu há três anos. São dezessete livros de poesia. De contos, três. Em 1985 editou um romance. Seu trabalho de antologista produziu nada menos que sete volumes, cinco das quais dedicados à poesia feita por poetas ou de Brasília ou relacionados, de algum modo, com Brasília. Registre-se que a sua antologia Poetas de Brasília, editada por um editor vindo de Goiânia, Francisco Scartezini Filho, foi o primeiro livro editado na nova Capital Federal.

Costuma-se dizer que Carlos Drummond de Andrade foi “o poeta de Itabira”. Pode-se afirmar, analogamente, que Joanyr de Oliveira foi um poeta de Aimorés e um poeta de Brasília. Aimorés: a origem forte, com a marca psíquica e moral fortíssima do pai, um operário comunista. Poeta de Aimorés: poeta especificamente do rio Doce, do trem de ferro, da Pedra Lorena (que se pode associar ao Pico Cauê de Drummond), do rio Natividade, da família sofrida, particularmente o Tio Joaquim, morto assassinado. Mínima amostra, eis a estrofe final do poema ‘‘Nostalgia” (Aimorés): “Aimorés clara emerge / do menino os pertences / nesta soma arbitrária / que me busca e me vence”. Brasília é os novos céus, que não apagaram nem suplantaram as fundas lembranças e heranças de Aimorés, mas as enriqueceram com um acervo abundante e forte. A atração e presença de Brasília se manifesta não só por meio das antologias que ele fez da poesia relacionada com Brasília, mas em poemas inspirados ou motivados por Brasília ou a Brasília dedicados. Destes, dois são dedicados, um a Lúcio Costa e o outro a Oscar Niemeyer. O mais longo de todos intitula-se “Poema (s) para Brasília” e merece que dele se transcreva a estrofe última: “§ Amoldado à aridez da atmosfera, / eu canto esta comuna / em seu milagre, em seus murmúrios. / Por mais que a concha azul e luminosa / me complete em loucuras. / Por mais que a secura da aragem / em suas cordas me sangre. / Por mais que as vibrações / indecifráveis do azul / dardejem-me a garganta”.

Voltando outra vez a Drummond, lembro que ele aconselhou certa vez a quem queira fazer poesia: “Não recomponhas tua sepultada e merencória infância”. Era um ponto de programa, um princípio de criação estética, um limite. No entanto, Carlos Drummond de Andrade descumpriu o seu conselho. Em alguns livros, exerceu o memorialismo com muita força: nenhum poeta recompôs tanto a própria infância quanto Carlos Drummond de Andrade. Também Joanyr de Oliveira, que me parece influído por Drummond também por causa da vizinhança geográfica entre Itabira e Aimorés, dedicou-se a reconstituir, nostálgico e mesmo saudoso, a sua sofrida e rica infância em Aimorés. Isso se documenta bem fortemente no seu livro Raízes do ser, que bem podia chamar-se Minhas raízes em Aimorés, ou Minhas raízes aimoresianas ou, como registra um dicionário, aimorense.

Finalizando, devo agradecer, com todas as forças da minha sensibilidade e consciência, a todas as pessoas – parentes, amigos, colegas deste grêmio e de outras entidades, intelectuais e escritores, – que, exercendo a bondade de comparecer a esta solenidade simples, mas para mim inesquecível e eloqüente, me ajudaram a vivê-la em toda a plenitude da sua significação. Dirijo um agradecimento muito especialmente comovido ao poeta Anderson Braga Horta, que me recebeu e saudou com sua compreensiva palavra valorizadora. Com ele tenho, ademais de outras, de ordem intelectual e artística, duas afinidades grandes. Uma, a de ser ele mineiro, uma gente com quem me dou invariavelmente bem. Às vezes tenho dito mesmo que, filho e neto de numerosa estirpe mineira, eu bem merecia ser mineiro por jus solis, a mais de o ser por jus sanguinis. A outra, a de ser Anderson, conforme já assinalei, um homem de longa e profunda vivência em minha terra goiana, pois lá passou parte da infância e da adolescência. Depois do discurso hoje proferido por Anderson Braga Horta para me saudar na entrada desta pujante agremiação intelectual, não serei mais o mesmo homem perante o mundo e sobretudo no meu próprio íntimo sentimento de mim mesmo.

Muito obrigado.

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Alaor Barbosa

Discurso de posse de Alaor Barbosa na Academia de Letras do Brasil (Cadeira n. 30, patrono Érico Veríssimo), proferido na noite de quinta-feira, 9 de setembro de 2010, na sede da Associação Nacional de Escritores (A.N.E.), em Brasília, Distrito Federal.



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Espero e confio que não será mal interpretada – como possível manifestação de vaidade – a minha afirmação de que meu ingresso na Academia de Letras do Brasil é fruto da insistência solidária e magnânima de um homem generoso: José Geraldo Pires de Melo. Um poeta – em tudo o que fazia. Não faz muito tempo, escrevi e publiquei um breve comentário sobre um livro de poesia dele, Oficina do Soneto. Antologia dos poemas escritos ao longo de mais de cinqüenta anos, bem representativa de um tipo de poesia e de uma posição de poeta diante da vida e do mundo. Poesia predominantemente amorosa: de amor do homem à mulher. Na poesia de José Geraldo a idéia e sentimento de amor se expressa com muita força e escapam de toda possível banalização, às vezes encontradiça nessa espécie de produção poética. É comovente a expressão do seu amor a Yeda Nícia, sua mulher a vida inteira: uma história documentada nos muitos poemas escritos desde o ano de 1952. História que se pode dizer edificante – o que, atrevo-me a dizer, deve ser considerado virtude em Literatura, ao contrário do que pensa muita gente que advoga a natureza amoral da Arte.

José Geraldo, o Jota dos amigos mais próximos, repito, foi um grande poeta no seu modo de ser, viver, atuar no mundo. De uma das manifestações do seu modo ser – pleno de generosidade criadora – tenho recolhido, nas derradeiras semanas, alguns depoimentos inesperados, atestadores da amizade – e amizade é poesia – que ele me concedia o privilégio de me dedicar. Fontes de Alencar, esse outro baluarte de cultura, sensibilidade, bondade e retidão humana que veio do Sergipe de antiga estirpe com raízes no Ceará (a estirpe Alencar), me contou, no dia em que combinamos a data da minha posse nesta Casa, que volta e meia, conversando com José Geraldo, este lhe dizia que não podia fazer tal ou qual coisa “enquanto o Alaor não tomar posse”; e, antes da minha eleição, algumas vezes se negou a tomar essa ou aquela providência, alegando que não podia fazê-la “antes que o Alaor seja eleito”. Igualmente Fábio de Souza Coutinho, esse outro caso exemplar de inteligência, cultura, retidão e bondade que convive conosco na Associação Nacional de Escritores e no Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, me contou, na noite da minha posse nesse Instituto, que José Geraldo o incumbira de “convencer o Alaor Barbosa” a aceitar ser posto no rol dos membros da Academia. Ainda mais comovente o depoimento de dona Yeda Nícia, a eterna musa, perenemente bela, de José Geraldo: ela me revelou que foi mais triste – por não ter assistido à minha posse, a que ele certamente presidiria – que ele se ausentou fisicamente da nossa convivência.

Em face de tais fatos, pergunto se existe peito de homem que se não comova. Homem comovível, me comovi muito, muito mesmo, ao saber dessas atitudes de José Geraldo. Sua amizade a mim ainda mais se valorizava porque formada sem a motivação mais comum da conterraneidade (ele filho do Rio de Janeiro, eu de Goiás) e apesar da diferença de idade: ele pertencia a uma geração bem anterior à minha. Fiquem aqui, registrados o mais solenemente possível, a minha homenagem e o meu agradecimento ao homem e ao poeta José Geraldo Pires de Melo.

Ainda antes de falar do meu patrono, Érico Veríssimo, devo explicar a minha resistência aos convites generosamente insistentes de José Geraldo para eu ingressar nesta já gloriosa Academia de Letras do Brasil. Permitam-me uma breve digressão útil.

Tive em Goiás o privilégio de ser contemporâneo, amigo de pouca convivência e interlocutor esporádico de um grande escritor goiano nascido em Minas Gerais, no município de Patos de Minas – Carmo Bernardes. Ele foi autor de extensa e valiosa obra literária que, mesmo em Goiás, ainda não se tornou bem freqüentada e condignamente conhecida. Seu romance Jurubatuba é um dos bons romances brasileiros; e seus contos são, na maioria, peças perfeitas que documentam muito bem a vida humana e social neste interessante trecho do mundo que é o Estado de Goiás, particularmente a região deste Planalto Central. Carmo, desde que veio de Minas, do município de Patos, aos seis anos de idade, viveu, mais ou menos até aos 30 anos de idade, na roça, em imediações do que depois se tornou a cidade de Brasília. Carmo é, que eu saiba, o único escritor autenticamente roceiro do Brasil. Em nossas conversações, em Goiânia, quase todas na rua e em esquinas, verificamos algumas afinidades intelectuais um com o outro. Uma delas, a que me interessa apontar e registrar aqui, a distinção entre escritor e literato. (Eu prefiro a palavra beletrista à palavra literato, para o efeito de expressar a nossa idéia.) Carmo e eu pensávamos que o certo, o importante, o válido é ser escritor e não literato. Escritor é aquele que escreve para expressar e documentar a sua visão da vida dos homens neste mundo com os seus mistérios e problemas, e com uma finalidade a um tempo digamos prática ou utilitária e transcendente de contribuir para elevar e libertar o Homem. Em duas palavras: nós dois pensávamos que o escritor autêntico é aquele que se preocupa com a condição humana nas suas dimensões essenciais de ente enigmático e misterioso e de ente político, mergulhado em problemas. Era mais ou menos essa a idéia que comungávamos. O literato (ou, prefiro eu dizer, o beletrista) tem uma visão fútil e frívola da Literatura e da Arte, na qual enxerga e a qual pratica como meio de se entreter e de se relacionar com as pessoas em sociedade, mais ou menos como quem coleciona gravatas, se homem, ou como a mulher que exibe vestidos chiques. Carmo era comunista e eu aceitava muita da filosofia marxista, principalmente a seriedade na visão e consideração das coisas do mundo. Isso facilitava e encaminhava nossos diálogos no rumo da concordância mútua. Posso dizer que a nossa concepção da responsabilidade do escritor foi muito bem expressa, embora não na sua totalidade, pelo grande escritor Érico Veríssimo, patrono da minha cadeira nesta Academia. No seu livro de memórias, Solo de clarineta, apresenta Érico Veríssimo uma boa síntese da sua idéia a respeito da responsabilidade social do escritor. Disse ele: “Desde que, adulto, comecei a escrever romances, tem-me animado até hoje a ideia de que o menos que um escritor pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como um sinal de que não desertamos nosso posto”.

Um dos corolários dessa idéia a respeito da distinção do escritor e do beletrista, ou homem de letras, era a rejeição das academias de letras no que elas possam ter, e tantas vezes têm, de agremiações de beletristas superficiais, fúteis, frívolos. Tanto eu como Carmo só aceitávamos participar de uma academia de letras concebida como associação de escritores e não de beletristas. E foi imbuídos dessa convicção que eu e ele aceitamos ingressar, mais ou menos na mesma ocasião, na Academia Goiana de Letras – que nos acolheu, alias, devo registrar, com tocante respeito e consideração. .

A esse propósito, convém uma breve digressão, que me parece útil e conveniente, para declarar bem o que penso a respeito do fenômeno academia literária e as razões por que pertenço a algumas. Aqueles que me conhecem me sabem um tanto infenso a academia, naquilo que as academias possam ter de conservadorismo estético e de culto da pompa e da vaidade. Para mim, academia – uma espécie do gênero reunião de que são também outras espécies os grêmios estudantis, os cenáculos literários, as panelinhas e grupinhos – constitui-se em um fenômeno social humano natural. Monteiro Lobato disse que os cenáculos são filhos do ajuntamento de “meia dúzia de vaidades afins”. Errou Lobato. Os cenáculos, os grupos artísticos, as panelinhas, constituem antes respostas à tendência, à vocação, à necessidade humana de se agremiar, necessidade mais sensível e atuante entre pessoas que se verifiquem entrelaçadas por vínculos de afinidades. Nós, homens e mulheres, precisamos naturalmente de nos reunir. A necessidade dos indivíduos de se reunirem corresponde à necessidade primária de sair da solidão e ao natural desejo de promoverem o autodesenvolvimento próprio e o da comunidade a que pertencem. Não há desenvolvimento humano sem debate de idéias, sem confronto de opiniões, sem o exercício da liberdade de pensar e de falar. E mais: os homens sentem precisão incoercível de mostrar o que fazem ou o que querem fazer. Penso que essa necessidade determinou, no passado mais remoto da vida cultural do Ocidente, o surgimento da instituição e da palavra academia. É uma história curiosa, pitoresca, interessante.

Vamos resumi-la.

Foi na Hélade – a Grécia Antiga. Não somente na principal cidade grega, Atenas – uma espécie de capital cultural da Hélade –; mas também em numerosas outras cidades helênicas, do continente e das ilhas e sobretudo das cidades coloniais fundadas e desenvolvidas na Ásia Menor, no litoral do mar Egeu, e no Sul da Itália, a Magna Grécia. Nesse variado arquipélago de cidades, fundaram-se e desenvolveram-se a Filosofia, a Dialética, a Lógica, a ciência atômica, o teatro, o romance, a fábula, a poesia lírica, o ensaio, a biografia, a autobiografia, o memorialismo literário, a História, Geografia, tudo isso e muita coisa mais.

Quem começou tudo foi o filósofo Platão, que criou, no ano de 386 (antes de Jesus Cristo, sabemos todos), em Atenas uma escola que duraria novecentos anos. Essa escola tomou o nome de Academia. Eis o caso. Platão tinha sido vendido como escravo pelo rei Dionísio I, de Siracusa, cidade-estado da Sicília. Ele foi libertado por um tal de Aniceres (certamente seu amigo), que pagou o preço do resgate. Para ressarcir a Aniceres, outros amigos de Platão, cotizando-se, levantaram a importância de três mil dracmas; mas Aniceres se recusou a receber o dinheiro. Então, esses amigos utilizaram o dinheiro para comprar uma – digamos assim, em linguagem atual – espécie de chácara, situada em um subúrbio de Atenas. Nessa propriedade existia um jardim dedicado a um herói ateniense, Akademos – aquele que revelou a Castor e Pólux o lugar onde se encontrava a irmã deles, Helena, a linda mulher que Páris arrebatou ao marido e levou para Tróia, o que provocou a guerra que Homero cantou naquele poema, Ilíada, que fundou a poesia épica do Ocidente. Em homenagem a Akademos, deram ao sítio o nome Academia. “Ali fundou Platão” – informa o historiador Will Durant – “a universidade que estava destinada a ser o centro intelectual da Grécia durante novecentos anos”. Importante, este fato: a Academia de Platão – que ele dirigiu por trinta anos, até morrer – era uma universidade. Nela se ministravam cursos de filosofia, ciências, letras. Durou mais do que duraram até agora as modernas e mais antigas universidades européias – fundadas quase todas entre os séculos XII e XIII da nossa era cristã: a de Bolonha, a de Coimbra, a de Paris, a de Oxford, etc. Durante muito tempo aceitei a informação – dada por um guia turístico em Atenas, em março de 1980, na minha primeira viagem à Europa –, de que a Academia de Platão foi a primeira universidade da Europa. Não é verdade. Will Durant esclarece: “Não foi, entretanto, a primeira universidade: a escola pitagórica de Crotona, já em 520, havia proporcionado uma variedade de cursos para uma comunidade escolar; a escola de Isócrates precedeu de oito anos a Academia”. E diz, falando de Isócrates (que foi discípulo de Sócrates, tal como Platão também o fora): “Em 391 abriu a mais bem sucedida de todas as escolas de retórica de Atenas. De todas as partes do mundo grego afluíam moços desejosos de se fazerem discípulos de Isócrates; talvez a variedade de origem e de aspecto desses estudantes auxiliasse o mestre a formar a sua filosofia pan-helênica”. A Academia de Platão foi, portanto, a terceira universidade da Europa. Aristóteles, discípulo de Platão, também fundou – em 334 a. C. – uma escola de retórica e filosofia que pode ser considerada uma espécie de universidade. Portanto, a quarta da Europa. Chamou-se Liceu – nome devido ao acaso, sem relação alguma com a coisa nomeada. Conta Will Durant: “Escolheu para local o mais elegante dos ginásios de Atenas, um grupo de edifícios dedicados a Apolo Liceu (deus dos pastores), cercou-o de sombreados jardins e alamedas cobertas. Pela manhã ensinava matérias adiantadas a estudantes regulares; durante o dia dava preleções a auditório mais popular, provavelmente sobre retórica, poesia, ética e política. Formou ali uma grande biblioteca, um jardim zoológico e um museu de história natural. A escola passou a chamar-se Liceu e a filosofia nela ensinada denominou-se “peripatética”, devido às alamedas cobertas (peripatoi) ao longo das quais Aristóteles costumava passear com seus discípulos enquanto dissertava”. De passagem, assinala Will Durant que houve “forte rivalidade” entre o Liceu, “cujos alunos vinham sobretudo das classes médias, a Academia, que tirava seus membros da classe aristocrática, e a Escola de Isócrates, que tinha a preferência dos gregos das colônias. A rivalidade cessou depois que a Escola de Isócrates se firmou na retórica, a Academia na matemática, na metafísica e na política, e o Liceu na ciência natural”.

Como se vê, o sentido original da palavra academia era este – de escola de ensino superior. As academias da Hélade Antiga muito pouca afinidade ou semelhança tiveram com as academias de letras modernas, destituídas de finalidades precipuamente didáticas ou pedagógicas. A acepção primordial se manteve no Brasil até há pouco tempo. As primeiras escolas superiores instaladas no Brasil, no século XIX, denominavam-se academias: Academia de Direito de São Paulo, Academia de Direito de Olinda, Academia de Medicina, etc. Mas algumas academias propriamente de letras surgiram antes, no século XVIII, no rastro das primeiras aparecidas depois da fundação da Academia Francesa, em 1635, em Paris. Iniciativa do Cardeal Richelieu, que então governava a França, sob o reinado do rei Luís XIV. Richelieu elaborou o estatuto, e fixou o número de acadêmicos – quarenta, que se tornou padrão de quase todas as academias congêneres. Essa origem oficial, governamental, estatal, foi também a de outras academias européias. A primeira academia de Portugal, que parece ter sido a Academia dos Generosos, criada em Lisboa em 1649; passou a chamar-se, em 1696, Academia das Conferências Discretas, e, na sua última fase, Academia Portuguesa. A segunda academia portuguesa, a Academia dos Singulares, surgida em 1653, tinha por emblema uma pirâmide com inscrições de nomes de vários escritores célebres, com a divisa “Solaque non possunt haec monumenta mori”. A Academia de Ciências e Letras de Lisboa – aquela que sobreviveu e se fortaleceu através do tempo e atualmente goza de muito prestígio – foi fundada em 1779. Sua primeira sessão pública realizou-se em 4 de julho de 1780.

As diversas academias de letras do nosso período colonial foram bem efêmeras: Academia Brasileira dos Esquecidos, criada em 1724, na Bahia; Academia dos Felizes, instalada em 1736, no Rio de Janeiro; Academia dos Seletos, fundada no Rio de Janeiro em 1752; Academia Científica do Rio de Janeiro, fundada em 1772 por um médico, José Henriques de Paiva, para estudos médicos, cirúrgicos, higiênicos, farmacêuticos, e também para pesquisas agronômicas e que interessassem ao desenvolvimento da lavoura e fossem uma garantia das culturas contra as pragas que as infestavam. Já após a Independência, surgiu a Academia de Medicina, em 1829, no Rio de Janeiro, composta de três secções; médica, cirúrgica e farmacêutica. Ela publica desde 1831 os seus Anais e teses apresentadas no seu plenário.

A primeira academia de letras que alcançou perdurar no tempo é a Academia Brasileira de Letras, do Rio de Janeiro. Fundaram-na, principalmente, Lúcio de Mendonça e Machado de Assis, em 1896. Foi instalada em 1897. No discurso de instalação da Academia – um modelo de concisão e elegância –, Machado de Assis, eleito presidente, expôs a sua concepção da missão, papel e sentido da Academia: “Não é preciso definir esta instituição. Iniciada por um moço, aceita e completada por moços, a Academia nasce com a alma nova e naturalmente ambiciosa. O vosso desejo é conservar, no meio da federação política, a unidade literária. Tal obra exige não só a compreensão pública, mas ainda e principalmente a vossa constância. A Academia Francesa, pela qual esta se modelou, sobrevive aos acontecimentos de toda a casta, às escolas literárias e às transformações civis. A vossa há de querer ter as mesmas feições de estabilidade e progresso”. Menos de cinco meses depois, em 7 de dezembro de 1897, em novo discurso, na sessão de encerramento do ano, Machado de Assis desenvolveu a sua concepção de Academia; ousadamente, afirmou: “Nascida entre graves cuidados de ordem pública, a Academia Brasileira de Letras tem de ser o que são as associações análogas: uma torre de marfim, onde se acolham espíritos literários, com a única preocupação literária, e de onde, estendendo os olhos para todos os lados, vejam claro e quieto. Homens daqui podem escrever páginas de história, mas a história faz-se lá fora. Há justamente cem anos o maior homem de ação dos nossos tempos, agradecendo a eleição de membro do Instituto de França, respondia que, antes de ser igual aos seus colegas, seria por muito tempo seu discípulo. Não era ainda uma faceirice de grande capitão, posto que esse rapaz de vinte e oito anos meditasse já sair à conquista do mundo. A Academia Brasileira de Letras não pede tanto aos homens públicos deste país; não inculca ser igual nem mestra deles. Contenta-se em fazer na medida de suas forças individuais e coletivas, aquilo que esse mesmo acadêmico de 1797 disse então ser a ocupação mais honrosa e útil dos homens: trabalhar pela extensão das idéias humanas”. Referindo-se aos trabalhos, na Academia, de elaboração de um anuário bibliográfico que serviria de subsídio a um futuro dicionário bibliográfico nacional e à coleta de “elementos do vocabulário crítico dos brasileirismos entrados na língua portuguesa e das diferenças no modo de falar e escrever dos dois povos, como nos obrigamos por um artigo do regimento interno”, o grande Machado, nesse mesmo discurso de fim de ano, declarou mais uma outra missão da Academia: “A Academia, trabalhando pelo conhecimento desses fenômenos buscará ser, com o tempo, a guarda da nossa língua. Caber-lhe-á então defendê-la daquilo que não venha das fontes legítimas – o povo e os escritores – não confundindo a moda, que perece, com o moderno, que vivifica. Guardar não é impor; nenhum de nós tem para si que a Academia decrete fórmulas. E depois para guardar uma língua, é preciso que se guarde também a si mesma, e o melhor dos processos é ainda a composição e a conservação de obras clássicas. A autoridade dos mortos não aflige, e é definitiva. Garret pôs na boca de Camões aquela célebre exortação em que transfere ao “Generoso Amazonas” o legado do casal paterno. Sejamos um braço do Amazonas; guardemos em águas tranqüilas e sadias o que ele acarretar na marcha do tempo”.

O sentimento e os impulsos federativos, fundamentos mas também efeitos da idéia de república, estimularam os Estados, no Brasil, a criar cada qual a sua própria academia. Em meu Estado, Goiás, sucedeu um caso singular. Foi uma mulher, Eurídice Natal, filha de um futuro ministro do Supremo Tribunal Federal, Guimarães Natal, quem fundou, em 1903, na antiga Capital, Goiás, a primeira academia de letras de Goiás, antecessora da atual, fundada em 1939 por um filho dela, Colemar Natal e Silva. Este acontecimento merece ser salientado como excepcional mérito da sociedade goiana: aquela época não concedia, em parte nenhuma do Brasil e do Mundo, tais direitos às mulheres. O pioneirismo goiano se faz mais admirável ainda se se recordar que no plano federal, na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro, as mulheres só vieram a alcançar direito de ingresso mais ou menos setenta anos depois.

De uns vinte anos para hoje, as academias de letras se municipalizaram no Brasil. Nada mais natural. A rigor, a Academia Brasileira de Letras, apesar do âmbito e expressão nacional da sua influência e representatividade, tem sido em alguns aspectos uma academia municipal. O Rio de Janeiro, logo depois da instauração da República, se classificava administrativamente como Município Neutro. Foi no contexto desse Município Neutro que apareceu a Academia Brasileira de Letras. Ela se tornou uma academia digamos nacional, ou federal, em virtude de duas circunstâncias não permanentes. A primeira, a circunstância política de ser o Rio de Janeiro a Capital federal. A segunda, a de que o Rio, por várias razões de ordem histórica e sociológica, era a metrópole para onde afluíam e onde se instalavam e atuavam os principais escritores e intelectuais do País. Hoje em dia, está em curso um acelerado processo de desconcentração do desenvolvimento econômico e cultural no Brasil. Em conseqüência, as instituições culturais de outros Estados, da maioria deles, tendem a se fortalecer cada vez mais como expressões de valores pessoais e culturais tão significativos quanto os que se projetam no Rio de Janeiro. E a Academia Brasileira de Letras vem apresentando uma perigosa tendência para, municipalizando-se de fato, tornar-se uma academia ou carioca ou fluminense.

Talvez se possa dizer que a Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais tenha sido pioneira na idéia e nas iniciativas de se criarem academias municipais de letras no Brasil. Não estou informado de quando surgiu, mas sei que tem bem mais de 30 anos. Se não me engano, foi em 1972 que tive a honra de receber de Juscelino Kubitschek – remetido pelo correio – um opúsculo com o seu discurso de posse nessa academia. Ele fora eleito como representante do Município de Diamantina, sua cidade natal. A Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais surgiu, presumo, da original idéia de congregar escritores, ou personalidades intelectuais ou artísticas, representativos dos municípios onde nasceram. É bom registrar que Juscelino foi eleito para ela num período em que ele se encontrava proscrito da vida política e social do nosso país. A eleição dele representou uma espécie de sutil desagravo dos seus coestaduanos, a brava e leal gente de Minas, à condição de Juscelino de homem punido, com as mais contundentes injustiças que o transformaram no maior mártir político da história do Brasil, pela ditadura de 1964.

Ao meu ver, a Academia de Letras do Brasil surgiu, já no nome que adotou, já com a sua localização representativa, sugestiva, privilegiada e simbólica, com a funda e essencial vocação de ser uma academia nacional: Uma academia da literatura do povo brasileiro. Assim a vejo. Assim, na minha opinião, deve ser vista e conduzida. Uma academia nacional, de escritores e não de beletristas.

A respeito do patrono da minha cadeira, que é de número 30, devo informar que fui eu quem o escolheu. José Geraldo, quando lhe comuniquei, tempos atrás, que aceitava entrar na Academia, me facultou designar o patrono da minha cadeira. Apontei Érico Veríssimo. Não o digo como reivindicação de glória, embora justa, mas como revelação de um compromisso e de uma intenção. Érico Veríssimo não foi um beletrista, um literato no sentido menor desta palavra. Foi um escritor, na acepção maior e integral do termo. Muito me apraz falar dele, embora ainda sem o conhecimento completo de sua obra. Li alguns dos seus livros, não todos. Sua obra é digna de ser lida integralmente, coisa que comecei a fazer há algumas semanas, lendo e relendo. Ainda antes dos de Érico Veríssimo, tenho lido, de nove meses para hoje, livros de outros autores rio-grandenses. Isso vem me permitindo e autorizando afirmar que, se a literatura brasileira consistisse somente na literatura do Rio Grande do Sul, seria ainda assim uma literatura rica, densa, vasta, forte e imensamente significativa; e que, se a literatura do Rio Grande do sul consistisse somente na literatura produzida por Érico Veríssimo, seria ainda assim uma literatura rica, densa, vasta, forte e imensamente significativa.

Quem é que, sendo leitor de livros, não conhece Érico VeríssimoErro! Indicador não definido.?

Érico Veríssimo nasceu em Cruz Alta, cidade situada na região central e serrana do Rio Grande do Sul, em 1905, e morreu em 1975, em Porto Alegre, quase na véspera de completar 70 anos de vida. Família muito importante no município de Cruz Alta. O avô paterno, o Dr. Franklin, foi um médico (homeopata e prático) muito respeitado e dono de estância grande. e morava em uma casas principais de Cruz Alta, apelidada de Sobrado – tal como a casa dos Cambará no romance O Continente. O avô materno era um estancieiro poderoso que empobreceu e viveu o resto da vida na cidade. O pai, Sebastião Veríssimo, foi farmacêutico durante algum tempo, mas faliu. Era uma personalidade de gaúcho típico, bem falante e muito mulherengo. Por causa disto sua mulher o abandonou, com o apoio dos filhos, principalmente do mais velho, Érico. Sebastião Veríssimo, depois de alguns anos marginalizado em Cruz Alta, mudou-se para São Paulo, onde morreu em estado de muita pobreza, mais ou menos aos cinquenta e dois anos de idade.

Um perfil da personalidade de Érico Veríssimo, composto de informações por ele mesmo fornecidas em suas memórias, mostra um homem que se afirma tímido, “sem o talento da oralidade” (apesar disso pronunciou mais de mil conferências e proferiu numerosos discursos), sempre capaz de vencer o próprio medo, mesmo o mais intenso e dominante, muito fiel aos próprios sentimentos, leal, verdadeiro, coerente. Ele se dizia um mero contador de estórias, como se essa condição o apequenasse como escritor. Só que ele foi um contador de estórias perfeito, impecável, intensamente produtivo.

Érico Veríssimo compôs uma vasta obra literária: romances, contos, estórias para crianças, livros de viagens. Eis uma lista dos seus livros: Fantoches, Clarissa, Caminhos cruzados, Música ao longe, Um lugar ao sol, Saga, As mãos de meu filho, O resto é silêncio, O tempo e o vento (O Continente, O retrato, O Arquipélago), Noite, O senhor embaixador, Incidente em Antares, Vida de Joana d’Arc, Os três porquinhos pobres, aventuras do avião vermelho, Rosamaria no castelo encantado, Aventuras de Tibicuera, Outra vez os três porquinhos, A vida do elefante Basílio, O urso com música na barriga, Viagem à aurora do mundo, Aventuras no mundo da higiene, Gente e bichos, Gato preto em campo de neve, A volta do gato preto, México, história duma viagem, Breve história da literatura brasileira.

Érico Veríssimo foi um grande narrador – contador de estórias. Um dos melhores da sua época. Porém, ele não foi um prosador original e brilhante, principalmente fora das narrativas de ficção. Mesmo no romance O Continente, tecido e atravessado de uma tocante epicidade que o coloca entre os grandes romances universais, a força da narrativa de Érico Veríssimo reside nos personagens e nas situações narradas, na energia reprodutora da verdade da vida e das coisas, e não em uma linguagem reinventada ou na reinvenção da linguagem. Érico escreveu de modo vamos dizer objetivo, despreocupado de originalidade e grandiloqüência, modesto mesmo, quase empenhado em nivelar-se ao leitor comum por meio de uma linguagem o mais clara possível, e frequentemente entremeada de locuções convencionais. Mas as situações por ele criadas são de tal modo humanas, verdadeiras, bem narradas, que o leitor — mesmo o mais exigente — sente, com entusiasmo e comoção, a força dramática e trágica a elas inerentes e dela emanantes. Sem empregar recurso algum de retórica – sem adjetivo e sem advérbio –, a narrativa de Érico Veríssimo consegue ser pungente quando precisa ser pungente e lírica quando deve ser lírica. Devagar e com astúcia, e de um modo fortíssimo, veraz, envolvedor, a narrativa de Érico Veríssimo empolga e conduz o leitor a penetrar devagar mas completamente no mundo criado por ele. E é com um crescente sentimento de interesse e mesmo de amor que o leitor adentra esse mundo — com seus habitantes humanos, seus problemas, sua realidade física, histórica, geográfica, social. E ocorre este fenômeno notável: em Érico Veríssimo até o lugar-comum – essa coisa detestável – se transfaz em ingrediente positivo, uma espécie de pecadilho perdoável ou aceitável cacoete. Com essas características, vou me repetir, ele conseguiu fazer, por exemplo, do romance O Continente, publicado em 1949, o qual reconstitui a saga da formação e evolução histórica do Rio Grande do Sul, desde os meados do século XVII até meados do século XX, talvez o melhor romance da literatura brasileira. O mais bem realizado. O de maior força expressional e comunicativa. O mais verdadeiro, humano e belo. Um romance de grandes personagens criados com o talento de um narrador magistral, inesquecíveis vidas reconstituídas com exata verdade e estupenda força. A história da família Cambará, a história da cidadezinha de Santa Fé, a história da Província do Rio Grande do Sul, a história do Brasil refletida no microcosmo de Santa Fé. Mais até do que nos outros romances, em O Continente a linguagem de Érico Veríssimo se apresenta despretensiosa, simples, de frases curtas, sem medo do lugar-comum e de repetições, sem rebuscamentos de expressividade e de estilo, dotada de extraordinária força de expressão, advinda de um forte poder de envolvimento, de uma honestidade simples, do seu dizer verdadeiro, da digna poesia que lhe emana das situações narradas.

A propósito desse romance, deve-se registrar um fato importante na evolução do escritor e do homem Érico Veríssimo. Confessa ele nas suas memórias que, até atinar com a matéria de O Continente, permaneceu um autor estritamente urbano. Foi devagar e à custa de vários auto-enganos que descobriu o povo do Rio Grande do Sul, a realidade gaúcha, a verdade e a força da gente da sua terra. Até então ele subestimava a sua gente, enquanto matéria literária. Descobrindo-a, ele se encontrou a si mesmo. Nasceu daí a trilogia romanesca que se abre com O Continente.

Além de grande escritor, Érico foi também um homem de ótimo caráter. Na minha opinião o escritor, por causa da sua elevada responsabilidade social, tem mais obrigação do que qualquer outra pessoa de possuir bom e positivo caráter e de zelar pela sua integridade e coerência. Érico Veríssimo foi um homem íntegro e coerente. Sempre proclamou e defendeu o primado da dignidade humana, das liberdades fundamentais, do dever de se lutar em favor da justiça e da igualdade entre os homens, do dever sempre se dizer, com honestidade e simplicidade, a verdade. Não era comunista, mas, recusando a injustiça e a desigualdade, rejeitava o que há de negativo e mau no capitalismo. Nunca se curvou passivamente diante do autoritarismo das ditaduras.

Salve Érico Veríssimo! Um ótimo e saudável modelo de escritor e de homem. Sobre ele posso fazer minhas estas palavras dos seus Editores, na Nota com que fizeram preceder o segundo volume do seu livro de memórias, Solo de clarineta: “...aquele que, ao longo de sua existência como cidadão e escritor, tornou-se um dos paradigmas da vida intelectual brasileira”.

Finalmente, devo expressar meus agradecimentos a todos os acadêmicos desta valorosa Casa que me fizeram seu colega perpétuo; a todas as pessoas que, comparecendo a esta solenidade, me honraram, valorizaram, prestigiaram, apoiaram; e muito especial, particular e comovidamente, ao escritor Danilo Gomes, que, com a força do seu talento e da sua militante generosidade, me estendeu a benfazeja mão da sua veneranda cidade de Mariana para me receber neste templo de cultura. Mais uma ação protetora com que me envolve a boa terra de Minas Gerais, essa inesgotável matriz de talentosa gente solidária.

Tenho dito.

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