PREFÁCIO por Henrique Martins da Silva
Príncipe dos Lobos é uma
boa dose de realidade que deve ser degustada com cautela, pois um marinheiro de
primeira viagem pode se engasgar ao tentar tomar de uma só vez. É envolvente, é
provocante! A reflexão é incitada ao mais alto nível e os “fantasmas sociais”
aparecem. Tudo aquilo que a sociedade considerou sujo, feio, impróprio, imoral,
inferior, detestável, ou seja, fora dos seus padrões e interesses ou até mesmo
“ameaçador à sua ordem”, tudo o que foi obscurecido, (re) surge. É um romance
forte e frisante! Indicado para aqueles com espírito livre e com sede para descobrir
o que está por trás das relações, das pessoas e dos lugares. “O admirável gado
novo” faz parte dessa trama. É assim que os trabalhadores oprimidos e
indivíduos marginalizados socialmente aparecem no livro. É assim que a banda
toca! A droga, a prostituta da esquina são semblantes de um mundo perverso. O
autor possui uma análise muito densa e crítica, o que instiga mais ainda o
leitor, ele vai direto à veia do problema, não há rodeios...
Príncipe dos Lobos apresenta
uma narrativa real, chocante e perversa no que tange o mundo das relações
humanas. A trama se desenvolve a partir das aventuras e devaneios do personagem
Robinson, primeiramente quando criança e depois na fase adulta. Trata-se de um
jovem que advindo de uma situação miserável e com vários problemas, inclusive
familiares, aprende a queimar as chamadas “pedras mágicas” como forma de
sucumbir o sofrimento e talvez preencher o vazio da própria alma, pelo menos
por alguns intervalos de tempo. Não é fácil, Robinson tem uma vida muito
conturbada, “vive entre lobos” e é atormentado por fantasmas que são seus
próprios medos, limitações e tragédias. É o retrato de um personagem vazio
praticando o individualismo no caminho das pedras.
Por intermédio de um traficante e cafetão, conhecido por
Draco, conhece e se apaixona por uma prostituta chamada Beatriz que o faz mudar
drasticamente, abandonando o vício. Como a raposa, ela é perspicaz — sabe jogar
— o influencia dizendo: “As pedras valem muito dinheiro e você as queima, seu
estúpido!”. As pedras são preciosas, o recado de Beatriz fora entendido.
Robinson aprendeu ainda na escola uma dança diferente, o Breakstyle que
despertou a simpatia de Draco, salvando-o da morte e do abismo existencial. É
quase paradoxal — “o cordeiro DANÇA entre lobos”.
A figura do lobo pode representar muitas coisas e, por
isso, é apresentada de forma muito ampla no livro, surpreendendo o leitor. É
como se a palavra lobo, fosse uma expressão psicanalítica para lidar com a
ausência, os medos e todo o mal banalizado e repreendido. Robinson descobrira
através de Draco, que os lobos são temidos, pois carregam o semblante das ruas.
Todavia, desde a infância já era cercado por lobos que o dilaceravam juntamente
com sua mãe, Edileusa.
Neste ambiente insalubre de relações, afundado nas drogas
e vivendo nas ruas, restava a Robinson ter ainda um pouco de dignidade, dominar
seus medos, traçar objetivos e cumprir a promessa que fez à mãe de dar-lhe uma
vida melhor. O cordeiro tem que legislar no mundo dos lobos para ser príncipe,
ou melhor, Príncipe Lobo. As pedras que antes eram queimadas passam a ser
vendidas — torna-se um negócio lucrativo, capitalista. A ideia de possuir
Beatriz o incentivou, estava disposto a enfrentar até mesmo Draco, quem o
acolheu. O Príncipe Lobo deveria ser respeitado e temido, mas isso não o torna
um vencedor. Pelo contrário, talvez seja sua própria ruína, pois o cordeiro
pode até acreditar que é um lobo, porém não deixa de ser um cordeiro.
Robinson é o protagonista, entretanto, Beatriz toma a
cena. Ora, o cordeiro realmente gostava dela — talvez ela representasse sua
redenção. Robinson quer viver como um príncipe ao lado de sua
princesa-meretriz. Mas isso não é tão fácil por causa dos obstáculos que
aparecem. As pedras não são suficientes para diminuir sua agonia, seus desejos
não têm limites e suas atitudes não medem as consequências. Ele está sem
controle, joga o jogo de Beatriz — ela o seduz e o engana. O cordeiro fica
entre o céu e o inferno — os lobos estão à espreita.
Beatriz, sagazmente, ensina tudo o que Robinson tem que
fazer para que possam ficar juntos. O Príncipe Lobo agora está pronto, começa a
caçada. Para alcançar seus objetivos está disposto a matar quem estiver em seu
caminho e de sua pretendida. O cordeiro não é mais o mesmo, torna-se determinado,
toma aspectos de um lobo e quer mostrar que pode ser um deles, ou melhor, o
príncipe deles.
O romance de Rogério Prego é uma denúncia social, mostra
que “os lobos” não estão somente nas ruas, podem estar mais perto do que se
imagina, até dentro de nossa família. Esses lobos estão por toda a parte e se
atracam na disputa por poder ou espaço. É um livro que questiona e confronta a
imagem do que está além do bem e do mal, transmitida principalmente pelos
veículos de comunicação. Não há soluções imediatas, pois um problema leva a
outro e, por conseguinte, em direção a uma raiz muito mais profunda do que se
imagina.
Nesse sentido, o autor foi bastante feliz em seu
propósito, uma vez que não nos apresenta respostas prontas, mas sim um campo de
possibilidades para que o leitor indague e tire suas próprias conclusões.
Afinal, toda a obra é uma grande crítica social e comportamental. É um tipo de
realismo fantástico que faz o leitor refletir e ensimesmar-se, pois querendo ou
não, alguma parte da obra irá lhe despertar uma identificação ou familiarização
pessoal. É um romance que vale a pena conferir. Está acima das expectativas que
possam ser despertadas neste prefácio. Real, Intrigante, Envolvente! Só lendo
para saber o que acontece com Robinson nessa aventura dantesca no mundo dos
homens-lobo.
— Henrique Martins da Silva (FH/ UFG)
Link do Livro:
ROGÉRIO PREGO nasceu em 1981 em
Goiânia - Goiás. Formado em História pela UFG. É o autor de Meu Sagrado
Reino da Escuridão, publicação em que apresenta os seus primeiros
escritos. Príncipe dos Lobos é o seu primeiro romance publicado. Em
breve, publicará o seu segundo romance: Loteria da Babilônia – Em busca
da aventura particular.
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